InDIGGnação

Uma seqüência numérica hexadecimal* foi suficiente para causar uma espécie de “motim virtual” no Digg. O assunto virou destaque em sites, blogs e fóruns de todo o mundo. E o que essa seqüência tem de tão especial? Trata-se de uma chave que consegue quebrar o AACS (Advanced Access Content System), um sistema de proteção criado para impedir a cópia de discos HD-DVD. Se essa chave for aplicada em um software específico para esse fim, pode-se quebrar essa proteção e então praticar o que a indústria considera pirataria.

Essa chave, na verdade, não é uma descoberta recente. Ao notar que essa seqüência estava sendo cada vez mais divulgada, a MPAA (Motion Picture Association of America), entidade que representa os gigantes da indústria cinematográfica, tratou de acionar autoridades para eliminar as páginas de divulgação já identificadas. Entre os sites reconhecidos estava nada menos que o Digg, o que não é surpresa, visto que quase tudo o que é notícia sobre tecnologia passa por esse site.

Aparentemente, os responsáveis pelo Digg não pensaram duas vezes antes de atender ao “pedido”. Todo o conteúdo que encontraram sobre o assunto foi eliminado, assim como a conta dos usuários que indicaram essas notícias. Os usuários mais assíduos do Digg entenderam o ato como uma arbitrariedade. Como reação, começaram a indicar páginas e mais páginas sobre o assunto. Outros usuários do site captaram a idéia e passaram a votar nessas páginas e a comentá-las furiosamente. Conclusão: durante um certo tempo, a página principal do Digg ficou tomada por indicações que tratavam da tal chave em hexadecimal.

Diante dessa monstruosa reação, os responsáveis pelo Digg se entregaram. Desistiram de eliminar o conteúdo que tratava da chave, pois viram que seria impossível controlar seus usuários. Um deles, Kevin Rose (fundador do site), chegou a escrever no blog do Digg um “desabafo”, com destaque para o seguinte trecho (traduzido):

(…) Mas agora, depois de ver centenas de notícias e ler milhares de comentários, vocês deixaram claro. Vocês preferem ver o Digg tombar lutando do que se rendendo diante de uma grande empresa. Nós ouvimos vocês e, a partir desse momento, deixaremos de eliminar notícias ou comentários contendo o código e enfrentaremos as possíveis conseqüências.

Bom, confesso que acompanhei essa história toda bastante surpreso. Se repararmos bem, veremos que a tal chave não é o elemento central de toda essa questão, pois, na verdade, os usuários protestaram para retaliar uma ação que julgaram abusiva, tal como se tivessem lhes tirado o direito de se expressar. Creio que apenas uma parcela pequena dos usuários estava realmente preocupada em dar uma resposta à MPAA…

Aliás, os executivos da MPAA devem estar arrancando os cabelos agora, pois ao exigirem a retirada do conteúdo que tratava do código no Digg e em outros sites (até o Google recebeu uma “solicitação” de não indexação de tais endereços), acabaram tendo resultados completamente diferentes: depois do “motim” contra o Digg, o número de páginas contendo o código aumentou significantemente. Aliás, criaram até um blog que tem o código em sua URL.

Quanto ao Digg, seus responsáveis aprenderam uma lição: é melhor correr o risco de morrer lutando contra a MPAA (e afins) do que contra os seus usuários. Com o primeiro, pelo menos ainda é possível reagir, mesmo que seja para tornar a morte mais lenta. Que drama, heim, Kevin?

Também trataram do assunto:

– BrPoint: Revolta de usuários no Digg: a primeira revolução do Ego;
– Techbits: O código da discórdia;
– CrisDias weblog: Esqueça 4, 8, 15, 16, 23, e 42.
 
Referências: The Inquirer, Slashdot, Digg the Blog, InformationWeek.

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Emerson Alecrim